quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Spiker

Quando eu tinha 16 anos, fiz uma loucura que poucos jovens com a minha idade teriam coragem de executar.
Era um sábado da primavera do ano de 2001 - é, aquele... 2001: uma Odisséia..., antes era com acento, hoje, não, ...no espaço. Engraçado! Pois bem, estavámos meu cachorro e eu em casa e não tínhamos nada para fazer. A feira da rua já havia findado suas atividades e víamos as pessoas retirarem as bancas e as frutas, ele no meu colo e eu quase dormindo no portão de casa. De repente veio uma vontade imensa de sair com Spiker para passear pelas ruas do bairro. Como a feira já tinha acabado, calculo hoje que seriam umas três e alguma coisinha da tarde.
Peguei a coleira e a guia dele e saímos. Minha intenção não era ir muito longe, mas fomos, hhihiiihi. Quando vi, já eram 5 horas tarde, e estávamos muito longe de casa. Daí veio a ideia maluca de continuar. E continuei. Olhei para o céu e estava tudo escuro, e nós dois com fome e frio, pois havia chovido naquela tarde, e muito. Andamos, andamos e o coitado cada vez mais cansado de andar. Em um determinado trecho ouvi a musiquinha tradicional do Jornal Nacional passando na TV, já eram oito e pouco, pode ter certeza... Sentei em uma praça com ele e acariciei seus pêlos com muito carinho, pedindo desculpas por tê-lo feito andar tanto. Acho que ele entendeu, pois imediatamente levantou-se e como se estivesse a me chamar, caminhou na frente. Corri um pouco e fomos juntos.
Um pouco mais à frente estávamos no Bairro da Penha, andando pela passarela e pegando a Radial ao contrário, rumo ao nosso destino, nossa casa.
Andamos muito, mas muito. Devemos ter andado uns 50 km naquele dia.
Por cada bairro que percorríamos, eu avistava-me no ônibus que fazia o mesmo trajeto na semana.
Como num passe de mágica, chegamos ao nosso bairro. Percebi que já era de madrugada e as ruas, a cada investida de nossos passos, ficavam mais desertas.
Spiker não aguentava mais andar, pedia-me para pararmos. Olhava-me com aquele olhar triste que só os cachorros sabem fazer, um semblante baixo e quieto. Eu me cobrava por dentro por estar a tanto tempo na rua sem comer e sem beber nada.
Em um certo trecho de nossa aventura, paramos na rampa de uma loja e por lá ficamos. Acho que cochilamos ali por uma meia hora. o meu travesseiro era Spiker e nossa cama era o cimento. Um amigo que não reclamava das loucuras de seu dono, apenas acompanhava.
Não aguentando o chão duro e frio, levantamo-nos e continuamos nossa árdua caminhada. Chegamos em casa cansados, com fome, com frio e mais amigos. Apesar de termos ido longe demais, ficamos sempre juntos. Eu o protegendo e ele a mim. Esteja bem, cão amigo.
A primeira coisa que fiz quando chegamos foi colocar sua panela de comida no mesmo lugar e observar sua fome sendo contida.

2 comentários:

  1. Gostei do tempo mágico dessa parte:

    "Por cada bairro que percorríamos, eu avistava-me no ônibus que fazia o mesmo trajeto na semana.
    Como num passe de mágica, chegamos ao nosso bairro. Percebi que já era de madrugada e as ruas, a cada investida de nossos passos, ficavam mais desertas."

    E gostei dessa frase tb: "Chegamos em casa cansados, com fome, com frio e mais amigos."

    Qq dia coloco no meu blog uma história, verídica, que eu e meu primo fomos atrás do arco-íris, mas ele sempre mudava de lugar!!! rsss

    Abrs! Wagner.

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  2. Que história hein, espero que vc tenha retribuido o amor que Spike sentia por vc! Os animais nos amam sem nada pedir em troca, mas é dever do ser humano amá-los igualmente! BELA história! Ótimo fim de semana!!! BYE

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